Fortaleza de São José de Macapá completa 240 anos neste sábado (19). Conheça a história

Essa imagem é de 1960, tendo à direita o canal outrora chamado “Doca da Fortaleza”.

De fortificação à museu, a Fortaleza de São José de Macapá chega a 240 anos

Por Célio Alício – historiador

Deverasmente celebrada, cantada, decantada, enaltecida, poetizada, festejada e carnavalizada ao longo de quase dois séculos e meio de existência, não somente no dia de seu aniversário de inauguração, mas em diferentes momentos de sua história, a Fortaleza de São Jose de Macapá completa em 19 de março de 2022, Dia de São José, padroeiro de Macapá, 240 anos de uma trajetória histórica absolutamente singular, com condimentos políticos, econômicos, socioculturais, religiosos e turísticos que foram sendo incorporados no cotidiano e no campo das mentalidades da população amapaense, especialmente da capital do estado.

Juntamente com a velha lgreja matriz – que mesmo substituída em suas funções religiosas por uma nova catedral há mais de 15 anos, conserva o magnetismo que faz dela um ente querido do povo católico local, a velha fortificação forma um conjunto de estruturas que além da mesma denominação carregam séculos de história e o testemunho da cidade de Macapá em seus primórdios e sua evolução histórica desde o século XVIII, acompanhando todas as transformações políticas, econômicas e socioculturais que se processaram na capital do estado desde então.

Até a criação do Território Federal do Amapá (TFA), em 1943, a fortificação recebera pouquíssima tanto do governo da capitania do Grão-Pará e Maranhão, no período colonial quanto da Província do Grão-Pará, durante o império ou do estado do Pará, a partir da proclamação da república. Até o advento do TFA, a Fortaleza era mais um destacamento militar do que necessariamente um complexo militar com a magnitude que caracterizou sua obra, já que mesmo dotada de aparelhamento e logística notáveis para a época de sua construção, nunca foi atacada, ou seja, foi uma praça de guerra que nunca entrou em operação.

A Fortaleza foi em 19 de março de 1782, com o status de um dos maiores edifícios construídos pela engenharia militar do império colonial português, embora tenha sido colocada em atividade ainda inconclusa, já que a parte da frente da estrutura, o revelim que constava na planta original não fora totalmente edificado por questões financeiras. Da indiferença que caracterizou o tratamento ao imponente edifício entre sua inauguração e a elevação do Amapá à categoria de território federal, foram 151 anos de semianonimato e abandono, a ponto de não raro ser citada como um local cheio de mato e animais peçonhentos.

Com a posse de Janary Gentil Nunes no governo do recém-criado território federal, em 1944, a Fortaleza passou a ter um tratamento diferenciado no comparativo com as épocas anteriores. Em 1950 foi tombada como patrimônio histórico do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e com isso emerge seu potencial turístico; foi o primeiro núcleo-base da Guarda Territorial (embrião da PM-AP) e do serviço militar obrigatório na época, o chamado “Tiro de Guerra”. Com o golpe militar de 31 de março de 1964 e o regime ditatorial que se seguiu, suas instalações serviram de masmorra para a prisão e tortura de presos políticos. A

Quando da comemoração de 200 anos, em 1982, o monumento recebeu do Governo do Território Federal do Amapá (GTFA), à época do primeiro mandato de Annibal Barcellos (1979-1985), uma grande programação festiva que mobilizou a população macapaense. O sistema de ensino promoveu concursos e gincanas e uma série de atrações até então nunca vistas marcaram o bicentenário da velha fortificação. A grandiosidade da comemoração fez com que a fortaleza fosse midiatizada e o fato ganhou repercussão nos âmbitos regional e nacional, e com isso, o monumento passou a ser uma pauta mais constante di governo local.

No governo de João Capiberibe, entre 1995 e 2003, a fortaleza ganhou a maior revitalização de sua história, com uma obra realizada pelo Iphan com contrapartida do governo do estado e que foi concluída em 2005, no governo de Waldez Góes. Em 2 de abril de 2007 a fortificação foi transformado em Museu Fortaleza de São José de Macapá (MFSJM), vinculado à Secretaria de Estado da Cultura (Secult) e tendo o objetivo de organizar sua estrutura e adequá-la à nova realidade local, nacional e planetária no curso da era digital, para servir à sociedade com qualidade e excelência.

Em 2007, um concurso cultural realizado pela revista Caras e o banco HSBC e denominado “As Sete Maravilhas Brasileiras”, através de votação on-line elegeu a Fortaleza de São José de Macapá entre as beldades arquitetônicas com mais de 500 mil votos entre trinta construções de todo o Brasil. Assim, a fortificação passou a compor o rol das “Sete Maravilhas do Brasil” tendo sido uma das concorrentes de destaque depois de mobilizar parcelas significativas da sociedade amapaense num grande esforço para garantir sua eleição. Nesse período, a Fortaleza teve como gestoras Zenaide Dutra e Obde Gadelha, e é gerenciada pelo Jubi de Souza desde 2020.

Nos dias atuais a Fortaleza se mantém como o maior referencial arquitetônico do estado ao lado da antiga Igreja de São José – que há cerca de duas semanas completou 261 anos -, e desde 2017 pleiteia junto à Unesco a condição de Patrimônio da Humanidade ao lado de outras fortificações brasileiras que almejam o título de Patrimônio Mundial do Brasil. Mais do que a sua extraordinária vocação turística, a velha fortaleza é muito mais do que um colosso arquitetônico: é antes de qualquer coisa, um bem material que goza do afeto e da estima da população e que contribui sobremaneira para a elevação do orgulho e da autoestima da gente amapaense.

Foto: IBGE